Carl Schmitt (1888–1985), jurista e teórico político alemão, é conhecido por suas críticas conservadoras e realistas à política moderna, ao liberalismo e à democracia. Sua obra, influenciada por sua formação católica e pelas experiências vividas durante a República de Weimar e o nazismo, enfatiza o conflito, a tomada de decisões e a autoridade como elementos centrais da política. Suas principais obras são “O Conceito do Político” (1932) e “Teologia Política” (1922).
Figura: Carl Schmitt

Fonte: https://en.wikipedia.org/wiki/File:Carl_Schmitt.jpg
| Associação com Autoritarismo e Nazismo A principal controvérsia em torno de Schmitt decorre de seus laços diretos com o regime nazista e das implicações autoritárias de sua obra. Após ingressar no Partido Nazista em 1º de maio de 1933, ele rapidamente se tornou um dos principais teóricos jurídicos do Terceiro Reich. Essa afiliação foi mais do que oportunista; sinalizou um endosso ativo às práticas totalitárias. Os críticos argumentam que o problema não é apenas a associação histórica, mas que as teorias de Schmitt fornecem justificativa intelectual para o totalitarismo. Eles afirmam que suas ideias não foram meramente apropriadas pelos nazistas, mas articuladas de maneiras que legitimam estruturas de poder autoritárias. Isso levanta a questão: sua associação com o Terceiro Reich — e o fato de ele ter promovido essas ideias enquanto membro do partido — invalida seu conceito de soberania ou sua teoria política mais ampla (em contraste com suas ações e propostas pessoais)? |
A Distinção Amigo-Inimigo como Núcleo da Política
Schmitt argumenta que o político surge da tendência humana fundamental de formar grupos com base em identidades coletivas, levando a conflitos inevitáveis. Para ele, a política é fundamentalmente definida pela distinção existencial entre “amigo” e “inimigo”, onde o inimigo representa um “outro” cuja existência representa uma ameaça ao modo de vida de alguém, potencialmente levando a um conflito mortal. Não se trata de ódio pessoal ou julgamentos morais, mas de um antagonismo público, baseado em grupos, que surge de diferenças de identidade, cultura ou crenças — como “encarnações de modos de vida ‘diferentes e estranhos’”. Para Schmitt, essa distinção é o “grau máximo de intensidade… de uma associação ou dissociação” e constitui comunidades políticas ao unir “amigos” contra estranhos. Ele via o conflito como um aspecto inerradicável da natureza humana, enraizado no pessimismo antropológico e em conceitos como Pecado Original, rejeitando ideais utópicos que buscam eliminar o antagonismo.
Soberania e o Estado de Exceção
Um famoso ditado de Schmitt é: “Soberano é aquele que decide sobre a exceção“. A soberania, para ele, não está vinculada a normas legais, mas se revela em crises ou emergências (o “estado de exceção“), onde o soberano deve suspender a lei para restaurar a ordem por meios extralegais. Esse “decisionismo” ressalta que a política requer autoridade decisiva além das regras, pois as normas pressupõem um “meio homogêneo” estável que se desmorona no caos. Na prática, isso justificou a expansão dos poderes presidenciais durante as crises de Weimar, priorizando a “legitimidade democrática” em detrimento dos limites constitucionais.
| Críticas ao Estado de Exceção e à Soberania O conceito de soberania de Schmitt como “aquele que decide sobre a exceção” enfrenta objeções significativas devido às suas implicações para o Estado de Direito e a governança democrática. Os críticos argumentam que o poder pessoal ilimitado representa uma desculpa para o poder ditatorial. A capacidade soberana de suspender a lei durante emergências é vista como potencialmente perigosa, visto que ditaduras de emergência raramente permanecem “temporárias”. Além disso, uma vez normalizada a exceção, os impedimentos para nomear oponentes como inimigos e usar a máquina estatal para persegui-los desaparecem, produzindo, em última análise, uma erosão contínua das proteções constitucionais sob o pretexto de gestão de crises, destruindo, em última análise, o Estado de Direito. |
Crítica ao Liberalismo e à Democracia Parlamentar
Schmitt era um crítico ferrenho do liberalismo, vendo-o como uma tentativa de despolitizar a sociedade, reduzindo os conflitos a discussões neutras, economia ou debates morais, o que, segundo ele, ignora a inevitabilidade da inimizade. O liberalismo, em sua visão, trata os inimigos como meros concorrentes, levando à “despolitização” e enfraquecendo a capacidade do Estado de se proteger. Ele atacou a democracia parlamentar como uma “farsa”, incapaz de conciliar o pluralismo com a necessidade de unidade política, argumentando que o debate interminável paralisa a ação diante de ameaças reais. A verdadeira democracia, para Schmitt, requer um povo homogêneo, capaz de uma vontade coletiva decisiva, e não o individualismo liberal.
Teologia Política
Schmitt afirmava que “todos os conceitos-chave da doutrina moderna do Estado são conceitos teológicos secularizados”, vinculando a política à teologia. A decisão do soberano sobre a exceção reflete a intervenção milagrosa de Deus, e a autoridade precisa de “fontes transcendentais, extrarracionais e supramateriais” para fundamentá-la. Ele via os humanos como “por natureza maus e licenciosos”, exigindo um Estado forte para conter o caos, sendo a rejeição disso pelo liberalismo considerada arrogância contra a ordem divina.
| Schmitt vs. Pensamento Político Católico As teorias políticas de Carl Schmitt e os ensinamentos da Igreja Católica representam abordagens fundamentalmente opostas à política, à autoridade e à sociedade humana. Enquanto Schmitt desenvolveu uma teoria baseada na distinção entre amigo e inimigo e na decisão soberana ilimitada, que culminou em seu apoio ao nazismo, a Igreja Católica fundamenta sua visão política na lei natural, na dignidade humana e no bem comum. O decisionismo de Schmitt coloca o poder soberano acima de todas as restrições morais, enquanto a doutrina social católica insiste que toda autoridade legítima deve servir à dignidade humana e operar dentro de limites morais objetivos. Seus conceitos de soberania diferem dramaticamente. A famosa definição de Schmitt do soberano como “aquele que decide sobre a exceção” justifica o poder executivo ilimitado e a suspensão da ordem jurídica durante crises. Em contraste, a teoria política católica enfatiza a subsidiariedade e a limitação da autoridade, onde até mesmo o poder papal opera dentro de estruturas doutrinárias e canônicas. A tradição católica sustenta que a autoridade injusta perde sua legitimidade, opondo-se diretamente à teoria da exceção soberana de Schmitt. Em relação ao conflito político, Schmitt vê o antagonismo como a essência da política, definindo o político por meio de distinções existenciais entre amigo e inimigo. A doutrina social católica enfatiza a solidariedade e o princípio de que “somos amigos e irmãos de todos os seres humanos”, buscando transformar o conflito em colaboração em vez de institucionalizar a inimizade. Enquanto Schmitt rejeita o pluralismo liberal por fragmentar a vontade política, a Igreja Católica endossa a liberdade religiosa e a governança democrática, mantendo os princípios morais. As consequências históricas dessas visões opostas se mostram decisivas. As teorias de Schmitt forneceram justificativa intelectual para o totalitarismo nazista, pois ele endossou os assassinatos de oponentes políticos e as políticas antijudaicas perpetradas por Hitler. A doutrina social católica se opôs consistentemente ao totalitarismo em todas as suas formas, com figuras como João Paulo II desempenhando papéis fundamentais na resistência aos regimes comunista e fascista. |
Citações Principais
“Soberano é aquele que decide sobre a exceção.” (Da Teologia Política)
“Todos os conceitos significativos da teoria moderna do Estado são conceitos teológicos secularizados, não apenas por seu desenvolvimento histórico – no qual foram transferidos da teologia para a teoria do Estado, por meio do qual, por exemplo, o Deus onipotente se tornou o legislador onipotente – mas também por sua estrutura sistemática, cujo reconhecimento é necessário para uma consideração sociológica desses conceitos. A exceção na jurisprudência é análoga ao milagre na teologia. Somente tendo consciência dessa analogia podemos apreciar a maneira como as ideias filosóficas do Estado se desenvolveram nos últimos séculos.” (Da Teologia Política).
“A essência do liberalismo é a negociação, uma cautelosa meia-medida, na esperança de que a disputa definitiva, a batalha sangrenta decisiva, possa ser transformada em um debate parlamentar e permitir que a decisão seja suspensa para sempre em uma discussão eterna.” (Da Teologia Política).
“A distinção política específica à qual as ações e motivações políticas podem ser reduzidas é aquela entre amigo e inimigo. (…) A distinção entre amigo e inimigo denota o grau máximo de intensidade de uma união ou separação, de uma associação ou dissociação. Ela pode existir teórica e praticamente, sem a necessidade de recorrer simultaneamente a todas essas distinções morais, estéticas, econômicas ou outras. O inimigo político não precisa ser moralmente mau ou esteticamente feio; não precisa aparecer como um concorrente econômico, e pode até ser vantajoso envolver-se com ele em transações comerciais. Mas ele é, não obstante, o outro, o estranho; e basta à sua natureza que seja, de forma especialmente intensa, existencialmente algo diferente e alheio, de modo que, em casos extremos, conflitos com ele sejam possíveis. Estes não podem ser decididos por uma norma geral previamente determinada, nem pelo julgamento de uma terceira parte desinteressada e, portanto, neutra. (De O Conceito do Político).
“O conceito de humanidade é um instrumento ideológico especialmente útil para a expansão imperialista e, em sua forma ético-humanitária, é um veículo específico do imperialismo econômico. Aqui, lembramos uma expressão um tanto modificada de Proudhon: quem invoca humanidade quer trapacear. Confiscar a palavra humanidade, invocar e monopolizar tal termo provavelmente tem certos efeitos incalculáveis, como negar ao inimigo a qualidade de ser humano e declará-lo um fora da lei da humanidade; e uma guerra pode, assim, ser levada à mais extrema desumanidade.” (De O Conceito do Político).
“A entidade política pressupõe a existência real de um inimigo e, portanto, a coexistência com outra entidade política. Enquanto um Estado existir, sempre haverá no mundo mais de um Estado. Um Estado mundial que abranja o globo inteiro e toda a humanidade não pode existir.” (De O Conceito do Político).
Schmitt no Diagrama Circular das Mentalidades Políticas Ocidentais
Carl Schmitt se encaixa melhor no grupo dos Conservadores Autoritários no Diagrama Circular das Mentalidades Políticas Ocidentais. Essa classificação se alinha à sua ênfase na forte autoridade estatal, na hierarquia, no tradicionalismo e em uma visão de mundo inerentemente conflituosa e que exige uma ordem decisiva — características que definem essa mentalidade.
| As ideias de Carl Schmitt comparadas com o conservadorismo tradicionalista de Russell Kirk. As ideias de Carl Schmitt compartilham alguns alinhamentos fundamentais com os cânones do conservadorismo de Russell Kirk, particularmente em sua ênfase mútua na hierarquia, na tradição e na rejeição do igualitarismo liberal e do racionalismo abstrato. Ambos os pensadores valorizam uma ordem social orgânica e historicamente enraizada em detrimento de reconstruções utópicas, e a teologia política de Schmitt ecoa a crença de Kirk em uma estrutura moral transcendente. No entanto, Schmitt diverge significativamente em seu decisionismo e na defesa de ações radicais durante estados de exceção, o que Kirk provavelmente consideraria uma inovação imprudente que arrisca a conflagração social. A associação de Schmitt com o regime nazista o distancia ainda mais do conservadorismo prudente e burkeano de Kirk, tornando sua proximidade, na melhor das hipóteses, moderada — próximos na crítica antiliberal, mas distantes no extremismo metodológico e nas implicações éticas. | |||
| Cânone de Kirk | Descrição | Ideia relacionada de Schmitt | Concordância/ Discordância |
| 1. Crença em uma ordem transcendente ou lei natural | Os conservadores acreditam em uma ordem moral duradoura, governada pela providência divina ou pela lei natural, que rege a sociedade e a consciência. | A teologia política de Schmitt postula que os conceitos políticos modernos são conceitos teológicos secularizados, e ele via a soberania como um reflexo da autoridade divina. Como católico, ele acreditava na maldade inerente ao homem e na necessidade de uma ordem que transcenda as construções humanas. | Concordância: Ambos enfatizam uma base moral ou teológica superior para a política, rejeitando o racionalismo secular puro. |
| 2. Afeição pela variedade e mistério da existência humana. | Os conservadores valorizam os costumes, as convenções, a continuidade e a diversidade das tradições humanas em detrimento da uniformidade e do igualitarismo. | Schmitt criticou o liberalismo por despolitizar a sociedade e impor normas universais, privilegiando “ordens” e distinções concretas e históricas (por exemplo, amigo-inimigo) que preservam a variedade existencial. | Concordância: Schmitt opôs-se às tendências homogeneizadoras do liberalismo, alinhando-se com a valorização da diversidade orgânica por Kirk. |
| 3. A convicção de que uma sociedade civilizada requer ordem e classes. | A sociedade precisa de hierarquia e classes para alcançar estabilidade, opondo-se ao igualitarismo sem classes. | Schmitt apoiava estruturas autoritárias e hierarquias, considerando a igualdade liberal como ilusória e defendendo uma liderança forte para manter a ordem. | Concordância: Ambos apoiam a estratificação social e rejeitam o igualitarismo radical. |
| 4. Persuasion that freedom and property are closely linked | A persuasão de que a liberdade e a propriedade estão intimamente ligadas. | Schmitt era cético em relação às liberdades econômicas liberais, considerando-as parte da despolitização, mas não se opunha explicitamente à propriedade; seu foco era a soberania do Estado sobre os direitos individuais. | Discordância parcial: Schmitt priorizou o decisionismo estatal em detrimento das liberdades individuais e dos direitos de propriedade, considerando-os secundários à unidade política. |
| 5. Fé na prescrição e desconfiança em projetos abstratos | Confiança nas tradições herdadas e ceticismo em relação às reconstruções racionalistas da sociedade. | O decisionismo de Schmitt enfatizava situações concretas em detrimento de normas abstratas, desconfiando do procedimentalismo do liberalismo parlamentar por considerá-lo uma forma de evitar decisões reais.. | Concordância: Ambos desconfiam de esquemas abstratos e utópicos, preferindo a autoridade historicamente fundamentada. |
| 6. Reconhecimento de que a mudança nem sempre é benéfica. | Reformas prudentes são preferíveis a inovações precipitadas, que podem levar à destruição em vez do progresso. | Schmitt defendia ações decisivas em estados de exceção, apoiando mudanças radicais como o regime nazista para restaurar a ordem, e considerando o gradualismo do liberalismo como uma fraqueza. | Divergência: A defesa que Schmitt faz dos poderes de emergência e das decisões revolucionárias contrasta com a cautela de Kirk contra mudanças rápidas. |
As ideias de Schmitt, como o poder do soberano de decidir sobre o “estado de exceção” e a distinção entre amigo e inimigo como essência da política, refletem uma preferência por controle centralizado e estabilidade em detrimento do pluralismo liberal ou da deliberação democrática, posicionando-o ao lado dos Conservadores Moderados (que compartilham valores tradicionais) e dos Estatistas Radicais (que compartilham tendências autoritárias como o militarismo e um governo forte).
| As ideias de Carl Schmitt comparadas com o fascismo de Mussolini e Rocco Em relação ao fascismo articulado por Mussolini e Rocco, o pensamento de Schmitt é notavelmente mais próximo, fornecendo fundamentos intelectuais que ressoaram com os regimes fascistas. Seu antiliberalismo, estatismo e dicotomia amigo-inimigo alinham-se estreitamente com o Estado totalitário, o nacionalismo e a aceitação da violência do fascismo. Embora Schmitt não fosse um ideólogo fascista central e se concentrasse mais na teoria jurídica do que no corporativismo econômico, suas ideias sobre soberania e política complementaram o Estado absolutista de Mussolini e a hierarquia autoritária de Rocco. A distância é mínima; a obra de Schmitt pode ser vista como uma ponte filosófica para o fascismo, embora ele mantivesse algumas reservas conservadoras que impediram uma fusão ideológica completa. | |||
| Pensador Fascists | Idea Central | Ideia relacionada de Schmitt | Concordância/ Divergência |
| Benito Mussolini | Anti-individualismo e estatismo: o Estado é absoluto, os indivíduos subordinados; opõe-se ao liberalismo, à democracia e ao socialismo. | O conceito de soberania de Schmitt enfatiza o poder de decisão do Estado sobre as normas, criticando o liberalismo por enfraquecer o poder político. | Concordância: Ambos priorizam o Estado em detrimento dos direitos individuais e rejeitam o parlamentarismo liberal. |
| Benito Mussolini | Nacionalismo e imperialismo: o fascismo busca a grandeza nacional através da expansão e da unidade. | A distinção entre amigo e inimigo, proposta por Schmitt, define a política como um conflito existencial, frequentemente em linhas nacionais, que sustenta entidades políticas fortes e unificadas. | Concordância: As ideias de Schmitt justificam confrontos nacionalistas e a união contra os inimigos. |
| Benito Mussolini | Corporativismo: Organização econômica sob controle estatal, integrando trabalho e capital. | Schmitt defendia um Estado forte que se sobrepusesse ao liberalismo econômico, mas não enfatizava o corporativismo; seu foco era jurídico-político, e não econômico. | Concordância parcial: Ambos veem o Estado dirigindo a sociedade, mas Schmitt estava menos focado em modelos econômicos. |
| Benito Mussolini | Violência e ação: O fascismo adota a violência como meio para atingir objetivos, sendo antipacifista. | Schmitt via a política como um antagonismo potencialmente violento entre amigos e inimigos, onde o Estado decide sobre a guerra. | Concordância: Ambos aceitam a violência como inerente ao âmbito político. |
| Alfredo Rocco | Crítica ao liberalismo e à democracia: considera-os como fatores que levam à anarquia; defende o Estado autoritário como uma entidade ética. | O antiliberalismo de Schmitt retrata a democracia como homogeneizadora e ineficaz, favorecendo a autoridade decisiva. | Concordância: Forte alinhamento na rejeição do liberalismo e na promoção de soluções autoritárias. |
| Alfredo Rocco | Supremacia do Estado: O Estado é superior aos indivíduos, organizando a sociedade hierarquicamente. | A soberania de Schmitt, enquanto decisão sobre exceção, coloca o Estado (ou soberano) acima de tudo. | Concordância: Ambos elevam o Estado à condição de autoridade máxima. |
| Alfredo Rocco | Sindicalismo sob o fascismo: controle de sindicatos e corporações para prevenir conflitos de classe. | Schmitt foi influenciado por ideias sindicalistas no início de sua carreira, mas depois passou a adotar visões centradas no Estado; ele apoiou o Estado totalitário nazista. | Concordância parcial: Schmitt apoiava o controle estatal sobre a sociedade, semelhante ao sindicalismo fascista. |
| Alfredo Rocco | Imperialismo cultural: o fascismo impõe valores e ordem de forma agressiva. | As ideias de Schmitt sobre teologia política e ordem implicam a imposição de unidade, mas de forma mais teórica. | Concordância: Ambos apoiam a imposição de ordem, embora Schmitt seja menos prescritivo em termos culturais. |
No arranjo circular do diagrama, os Conservadores Autoritários se opõem aos Esquerdistas Democratas, que priorizam a democracia e a igualdade — uma dinâmica evidente nas críticas de Schmitt aos sistemas parlamentaristas e aos ideais universalistas, que ele via como enfraquecimento da ordem hierárquica.
O suporte histórico para esse posicionamento inclui a breve associação de Schmitt com regimes autoritários na Alemanha da década de 1930, semelhante a exemplos como a Espanha de Franco, onde o tradicionalismo conservador se fundiu com o controle estatista. No entanto, ele também poderia ser classificado como fascista ou protofascista (Estatista Radical) com elementos conservadores, revelando, mais uma vez, a fluidez das classificações e mentalidades políticas.
Texto selecionado
Carl Schmitt. Teologia Política. Quatro capítulos sobre o conceito de soberania. Tradução para o inglês de George Schwab. Tradução para o português: Google Tradutor. The University of Chicago Press: Chicago e Londres.
1. Definição de Soberania
Soberano é aquele que decide sobre a exceção.
Somente esta definição pode fazer justiça a um conceito limítrofe. Ao contrário da terminologia imprecisa encontrada na literatura popular, um conceito limítrofe não é um conceito vago, mas sim um conceito pertencente à esfera mais externa. Esta definição de soberania deve, portanto, ser associada a um caso limítrofe e não à rotina. Logo ficará claro que a exceção deve ser entendida como um conceito geral na teoria do Estado, e não meramente como uma construção aplicada a qualquer decreto de emergência ou estado de sítio.
De uma perspectiva prática ou teórica, realmente não importa se um esquema abstrato proposto para definir a soberania (ou seja, que a soberania é o poder supremo, não um poder derivado) é aceitável. Sobre um conceito abstrato, em geral, não haverá discussão, muito menos na história da soberania. O que se discute é a aplicação concreta, ou seja, quem decide, em uma situação de conflito, o que constitui o interesse público ou o interesse do Estado, a segurança e a ordem públicas, a saúde pública, e assim por diante. A exceção, que não está codificada na ordem jurídica vigente, pode, na melhor das hipóteses, ser caracterizada como um caso de extremo perigo, um perigo para a existência do Estado, ou algo semelhante. Mas não pode ser delimitado factualmente e obrigado a se conformar a uma lei preestabelecida.
Existem diversas apresentações históricas que abordam o desenvolvimento do conceito de soberania, mas elas se assemelham a compilações didáticas de fórmulas abstratas das quais se podem extrair definições de soberania. Ninguém parece ter se dado ao trabalho de examinar a fraseologia frequentemente repetida, porém completamente vazia, usada para denotar o poder supremo pelos autores renomados do conceito de soberania. Que esse conceito se relaciona ao caso crítico, à exceção, foi reconhecido há muito tempo por Jean Bodin. Ele figura no início da teoria moderna do Estado por causa de sua obra “Das Verdadeiras Marcas da Soberania” (capítulo 10 do primeiro livro da República), e não por causa de sua definição frequentemente citada (“soberania é o poder absoluto e perpétuo de uma república”). Ele discutiu seu conceito no contexto de muitos exemplos práticos e sempre retornava à questão: até que ponto o soberano está vinculado às leis e até que ponto é responsável perante os estados? A esta última e importantíssima questão, ele respondeu que os compromissos são vinculativos porque se baseiam no direito natural. Mas, em situações de emergência, o vínculo com os princípios naturais gerais se desfaz. De modo geral, segundo ele, o príncipe tem obrigações para com os estados ou o povo apenas na medida em que cumpre sua promessa no interesse do povo; ele não tem tais obrigações em condições de extrema necessidade. Essas teses não são de forma alguma novas. O ponto decisivo sobre o conceito de Bodin é que, ao se referir à emergência, ele reduziu sua análise das relações entre príncipe e estados a uma simples dicotomia.
(…)
Em contraste com as apresentações tradicionais, demonstrei em meu estudo sobre ditaduras que mesmo os autores do direito natural do século XVII entendiam a questão da soberania como a questão da decisão sobre a exceção. Isso é particularmente verdadeiro no caso de Samuel von Pufendorf. Todos concordam que, sempre que surgem antagonismos dentro de um Estado, todas as partes desejam o bem comum — afinal, aí reside o bellum omnium contra omnes. Mas a soberania (e, portanto, o próprio Estado) reside em decidir essa controvérsia, ou seja, em determinar definitivamente o que constitui ordem e segurança públicas, em determinar quando elas são perturbadas, e assim por diante. A ordem e a segurança públicas se manifestam de maneiras muito diferentes na realidade, dependendo se uma burocracia militarista, um órgão de autogoverno controlado pelo espírito do comercialismo ou uma organização partidária radical decide quando há ordem e segurança e quando elas são ameaçadas ou perturbadas. Afinal, toda ordem jurídica se baseia em uma decisão, e o próprio conceito de ordem jurídica, aplicado como algo autoevidente, contém em si o contraste entre dois elementos distintos: a norma jurídica e a decisão. Como qualquer outra ordem, a ordem jurídica se fundamenta em uma decisão e não em uma norma.
(…)
3. Teologia Política
Todos os conceitos significativos da teoria moderna do Estado são conceitos teológicos secularizados, não apenas devido ao seu desenvolvimento histórico – no qual foram transferidos da teologia para a teoria do Estado, de modo que, por exemplo, o Deus onipotente se tornou o legislador onipotente – mas também devido à sua estrutura sistemática, cujo reconhecimento é necessário para uma análise sociológica desses conceitos. A exceção na jurisprudência é análoga ao milagre na teologia. Somente reconhecendo essa analogia podemos compreender como as ideias filosóficas do Estado se desenvolveram nos últimos séculos.
(…)
Conclusão
Embora o pensamento de Schmitt tenha influenciado críticas conservadoras mais amplas e até mesmo algumas críticas esquerdistas ao liberalismo, seu foco principal na autoridade e no nacionalismo o enraíza firmemente como um conservador autoritário.
Questões para reflexão
1. Como o conceito de Carl Schmitt da distinção entre amigo e inimigo explica a intensificação da polarização política nas democracias contemporâneas, como a divisão entre facções progressistas e conservadoras nas plataformas de mídia social?
2. Como o conceito schmittiano de soberania como “aquele que decide sobre a exceção” se manifesta nas democracias contemporâneas durante crises como pandemias, terrorismo ou emergências climáticas?
3. Como o conceito de “emergência permanente” de Schmitt se manifesta em regimes que normalizam poderes excepcionais, transformando medidas temporárias em ferramentas permanentes de controle político?
4. Como a distinção entre amigo e inimigo de Carl Schmitt critica a representação, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), de dissidentes e disseminadores de desinformação como ameaças existenciais às instituições, justificando violações de direitos?
5. O exagero judicial de figuras como o Ministro Alexandre de Moraes no Brasil exemplifica o alerta de Schmitt sobre a despolitização do liberalismo, levando a um autoritarismo disfarçado em nome da proteção institucional?
6. Em que medida as ações do ministro do STF Alexandre de Moraes exemplificam o uso do estado de exceção schmittiano para silenciar opositores políticos sob o pretexto de defender a democracia?
7. Aplicando o conceito de soberania de Schmitt, a supressão do direito à liberdade de expressão pelo judiciário brasileiro é uma manifestação de decisão sobre a exceção, mascarada como salvaguarda das normas democráticas?
8. Como as ideias de Schmitt sobre homogeneidade política podem explicar os esforços dos tribunais brasileiros para impor o controle narrativo e censurar a oposição, apresentados como uma defesa contra ameaças às instituições nacionais?
9. Como o julgamento de Bolsonaro pelo STF ilustra como o judiciário pode assumir o papel de soberano schmittiano, decidindo quem constitui o “inimigo” político e suspendendo as garantias constitucionais normais?
10. Em que medida as sanções americanas contra o ministro Alexandre de Moraes e sua família demonstram tensões internacionais quando um judiciário nacional aplica as teorias schmittianas de exceção contra cidadãos e instituições estrangeiras?
11. A associação de Schmitt com o Terceiro Reich — e o fato de ele ter promovido essas ideias enquanto membro do partido — invalida seu conceito de soberania ou sua teoria política mais ampla (em contraposição às suas ações e propostas pessoais)?

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